
Sou artista trans, e assim como meu corpo, meu trabalho nasce do atrito entre linguagens, corpos e tecnologias. Interesso-me pelos territórios onde as fronteiras se tornam nebulosas entre teatro, cinema, vídeo, artes visuais, música e escrita. Minha pesquisa está menos em cada campo isolado e mais na fricção que acontece quando eles se encontram, e quando o corpo, em sua potência de fabulação, se insere nesse espaço.
Meu olhar está voltado para experiências que atravessam tabus, discursos interditados e zonas de silêncio, mas não de maneira pedagógica. O que me interessa é criar imagens, sons e situações que tensionem convenções, convidando o público a habitar estados de suspensão, estranhamento e, ao mesmo tempo, empatia . Ao lidar com temas como transgeneridade, drogas, maternidade e violência simbólica, não busco explicá-los, mas expandi-los em linguagem.
Ser trans, para mim, é estar sempre em trânsito; entre gêneros, entre categorias, entre estéticas. É um gesto que contamina a própria forma como crio: borrando os limites da narrativa linear, experimentando novas dramaturgias sonoras e visuais, revelando os artifícios para que o espectador possa escolher como se relacionar com a obra.
Minha trajetória em teatro, cinema e artes visuais se alimenta do desejo de inventar novas formas de percepção. Do palco à tela, da realidade virtual às sonoridades do cotidiano, procuro tensionar as tecnologias (do corpo às máquinas) para abrir frestas em que a experiência artística possa ser vivida como ritual, como jogo ou como fenda poética.
Atualmente, desdobro minha pesquisa em criações que assumem formas híbridas e tensionam o limite entre ritual e linguagem. Mato Minha Mãe Cruelmente é um documentário que também se apresenta como exposição, onde utilizo inteligência artificial e deepfake não apenas como ferramentas, mas como matéria estética para dar corpo à memória borrada e ao inconsciente. O filme revisita minha relação com minha mãe, atravessada pela dependência química, pela ausência e pelo amor, e propõe uma reflexão sobre maternidade para além da expectativa social ou da idealização do cuidado. Ao borrar o que é registro, ficção ou delírio, questiono também os próprios paradigmas do cinema. Em Feiura Comovente, meu último Curta, experimento outra fronteira: faço do meu corpo um lugar de risco real , em uma suspensão corporal verdadeira dentro de um filme ficcional, para investigar até onde vai o gesto do personagem, da cena e do ato de assistir cinema, pesquisa essa em processo no teatro. Já em Brutal, minha nova dramaturgia, proponho a figura de um padre trans em performance, onde sacrifício, rito e transe se tornam um espaço para encarnar as contradições e devires que habitam o humano. Esses trabalhos, embora distintos em forma, convergem em uma mesma pergunta: como a arte pode ser vivida como entrega espiritual, como espaço de atravessamento em que corpo, tecnologia e fabulação se confundem?
CV
Ultra Martini é artista transdisciplinar, formado em Artes Cênicas pela Universidade de Brasília e em Direção Cinematográfica pela Academia Internacional de Cinema (AIC), com especialização em Roteiro pela Roteiraria e em Literatura pela PUC-RS.
Em 2025, Ultra, participou de um programa internacional da Funarte que selecionou dez jovens artistas brasileiros com carreiras emergentes para apresentar projetos no Festival de Avignon, em atividades de pitching e networking, ao qual apresentou seu novo Projeto em processo; Brutal. No mesmo ano, estreou o curta-metragem Feiura Comovente, exibido em festivais como Tiradentes, Kinoforum e MixBrasil. Em 2025 ainda, foi preparador de elenco nos filmes Conheço o Final, de Izadora Marins, e Revelação, de Gabriela Gaia. Em 2024, trabalhou como preparador de elenco no filme Tudo o que eu posso te dar, de Izadora Marins. Em 2023, lançou seu primeiro curta-metragem, Súplica, performando o som ao vivo, na Mostra MIS. No teatro, Brutal foi selecionado para o laboratório Novas Dramaturgias do Itaú, uma residência artística para dramaturgos, ministrado por Marici Salomão e Sylvia Dias. E, também em 2023, Atuou no projeto imersivo Autorretrato, de Felipe Hirsch. No campo da realidade virtual, foi co-diretor de Deeper, ao lado de Janaína Leite, com estreia em Edimburgo e patrocínio do Itaú. E também atuou no longa No Vazio de Domingo à Tarde, de Gustavo Galvão, que teve sua estreia na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
Em 2022, assinou a sonoplastia do espetáculo VINEN POR MI, dirigido por Janaína Leite. Também integrou o espetáculo A História do Olho, com estreia pela MIT (2022) de Janaína Leite, como ator e diretor musical, em circulação internacional pela Alemanha, no festival Adelante (2024) e pelo Festival de Avignon (2025)
Em 2019, atuou como ator e assistente de direção em Estrada sem Mapa, de Silvero Pereira.
Em 2018, ganhou o Prêmio Sesc Candango de Melhor Sonoplastia Pelo seu espetáculo autoral Stanisloves-me e foi Indicado a Melhor atriz Pelo mesmo espetáculo. protagonizou o curta Andrômeda, de Lucas Gesser.
Em 2017, venceu o FESTU RJ de Melhor Atriz por Ab-reação e recebeu sua segunda indicação consecutiva como Melhor Atriz pelo Espetáculo Entre- Quartos do grupo tripé, novamente pelo, Sesc Candango.
Em 2016, venceu o FESTU RJ de Melhor Ator por Stanisloves-me, além de ser indicado nas categorias de Melhor direção e Melhor Espetáculo. Atuou, roteirizou e dirigiu Musicalmente, o espetaculo musical Decadenta, de Felícia Johansson. Protagonizou o Curta De Repente, de Bruno Caldas, com estreia na Mostra Internacional de Brasília. Reconhecido como um dos novos talentos do cinema latino-americano, Ultra foi selecionado para o Talents Buenos Aires 2021. Atualmente, desenvolve seu longa-metragem Mato Minha Mãe Cruelmente, documentário experimental que utiliza inteligência artificial e deepfake como recursos estéticos para questionar a maternidade e a memória, já selecionado para o pitching em Mônaco.